A restauração de nosso corpo e mente são elementos essenciais para uma saúde completa. Atualmente vivemos um estilo de vida intenso, excitante e que nos propicia estarmos sempre ligados em tudo o que acontece, sem o direito de descansar, dormir ou buscar algo mais reparador. 

Junto a esse modo de viver muito focado em produtividade e resultados, muitas pessoas deixam o descanso e o sono em segundo plano, aumentando o risco para o desenvolvimento de distúrbios mentais, autoimunes e endocrinológicos. 

Imagino que você já tenha escutado o termo privação do sono. Tecnicamente significa que você dorme em quantidade e qualidade insuficiente e muitos estudos científicos demonstram que pessoas expostas a esta situação adoecem de forma mais frequente. Níveis reduzidos de testosterona, elevados níveis de cortisol, depressão, ansiedade, hipertensão, obesidade e diabetes tipo 2 são as doenças ou distúrbios mais descritos na literatura e que se relacionam a privação. 

A National Sleep Foundation mostra que para uma ótima saúde, o sono necessita ter uma duração de 7 a 9 horas para adultos de 26 a 64 anos e 7 a 8 horas para adultos a partir de 65 anos e, além disso, a qualidade e profundidade também contam. 

E seu eu te contar que a qualidade do sono pode influenciar em suas escolhas alimentares? Logo, a privação de sono tem sido considerada como um fator de risco para o desenvolvimento de obesidade e, acredite ou não, essa situação se aproxima cada vez mais dos jovens. Devido a grande exposição às telas e jogos aos quais estão sendo expostos, a sua atividade cerebral está sempre a mil e o sono vai por água abaixo.

Certa vez atendi um “jovem senhor” que se sentia exausto física e mentalmente, queixava-se de baixa produtividade, notava uma sensação frequente de frustração e tristeza. Depois de uma conversa mais leve e um retorno para avaliar seus resultados, fomos nos dando conta do que acontecia em sua rotina e que favorecia esta condição. Muito estresse, sedentarismo, inúmeras horas em frente a celular e computadorapenas 5 horas de sono com despertares noturnos foram os pontos chave para o reconhecimento de todo este processo.

Cada vez mais, percebo que a maioria das pessoas associa o cansaço físico à apenas alguma atividade exclusivamente física, porém se paramos e pensamos um pouco, o nosso cérebro é o maior “gastador” de energia que temos, portanto, a falta de restauração deste importante órgão pode propiciar esta fadiga mental, mas também a física. 

Mas porque mudamos o nosso hábito alimentar quando dormimos pouco e mal?

O nosso hipotálamo tem muitos centros neuronais e trabalha junto com outra área cerebral chamada de núcleo paraventricular. Nestes dois centros cerebrais existem receptores que recebem sinais emitidos diretamente de hormônios que são produzidos em nosso intestino e tecido adiposo. Estes sinalizadores atuam em áreas cerebrais regulando ora uma atitude que nos faça comer mais (orexígeno) ora uma atitude de comer menos (anorexígeno), conforme a necessidade fisiológica que se apresenta. 

Quando existe a privação em nosso sono, esses e outros neurotransmissores alteram a sua fisiologia e aqueles que nos fazem comer mais trabalham de maneira mais eficiente (grelina e neuropeptídeo Y, por exemplo). A leptina, por exemplo, é liberada pelo tecido adiposo e por isso recebe o nome de citocina, e, frente a privação do sono, sofre redução em sua ação saciadora em nível cerebral, pois seus receptores diminuem. Outra consequência das recorrentes noites de sono mal dormidas é que nossos tecidos se tornam mais resistentes à ação da insulina, e com isto nossos níveis de glicemia sobem, o que pode resultar em aumento da sensação de fome –sem contar o aumento no risco para o diabetes. 

Resultado… você vai comer mais!

Pesquisadores observaram um aumento em 22% da energia consumida em homens após uma noite com 4 horas de restrição do sono. Embora o aumento nas calorias totais tenha sido observado por outros investigadores, muitos são os fatores possíveis quando o assunto é o consumo alimentar, inclusive alteração na qualidade do que comemos em detrimento da nossa química cerebral e corporal. Outras pesquisas observaram maior ingestão de gordura total, inclusive as saturadas, lanches ricos em carboidratos e sobremesas,  além de lanches noturnos densos em energia à medida que nos privamos de uma boa noite de sono. 

Mas eu não tenho sono, o que fazer?

A sugestão é procurar ajuda de um profissional especializado em sono. Hoje em dia temos exames muito precisos que podem contribuir com o diagnóstico de algum possível distúrbio, porém, outras ações relacionadas a comportamento podem ser incorporadas. Anote aí e comece a sua mudança:

  • Ensine o seu corpo a dormir se afastando de telas de computadores e celulares a partir das 20 horas;
  • Crie uma rotina e tenha paciência. Digo isso, porque estas novas atitudes podem demorar um pouco para gerarem resultados, mas tenha certeza de que você vai conseguir;
  • Traga  para a sua realidade alguma atividade que te relaxe e provoque sensações prazerosas: leitura, meditação, tricô, pintura;
  • Deite-se mais cedo e desligue as luzes. Apoie o seu corpo e o seu relógio circadiano,  oferecendo a si mesmo uma nova alternativa de vida;
  • Evite alimentos ricos em substâncias estimulantes como café, chá preto ou mate, chocolate e pimenta, e os substitua por infusão de capim cidreira, melissa e passiflora.

E o mais importante de tudo: mantenha-se tranquilo, seja paciente e compassivo com você e confie nesta nova trajetória repleta de experiências agradáveis e saudáveis. Você vai colher os frutos!

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas

Liu, S.; Wang, X.; Zheng, Q.; Gao, L.; Sun, Q. Sleep Deprivation and Central Appetite Regulation. Nutrients 202214, 5196. https://doi.org/10.3390/nu14245196.
Dashti, H. S., Scheer, F. A., Jacques, P. F., Lamon-Fava, S., & Ordovás, J. M. (2015). Short Sleep Duration and Dietary Intake: Epidemiologic Evidence, Mechanisms, and Health Implications. Advances in Nutrition, 6(6), 648–659. doi:10.3945/an.115.008623.